Trabalho, educação e dignidade humana (publicado no Jornal do Tocantins de 09.06.2010)

Trabalho, educação e dignidade humana

Gilson Pôrto Jr é pedagogo, jornalista, mestre em Educação e doutorando em Comunicação e Culturas Contemporâneas e coordena o grupo de pesquisa Educação, Cultura e Transversalidade (Unitins).
E-mail: gipounitins@gmail.com

Em 2010, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela ONU, completa 62 anos. Já em seu preâmbulo, aponta-se para “o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis”. O trabalho e a educação estão presentes na Declaração.

Friedrich Engels escreveu, nesse sentido, em 1876 um ensaio intitulado “O papel do trabalho na transformação do macaco em homem”. Nele, Engels afirma que “o trabalho, porém, é muitíssimo mais do que isso (produzir riqueza). É a condição básica e fundamental de toda a vida humana. E em tal grau que, até certo ponto, podemos afirmar que o trabalho criou o próprio homem”.

O trabalho está diretamente ligado à condição da dignidade humana e, não sem motivo, apontada como fator fundamental. É fato que, no Brasil, 7,3% da população economicamente ativa em abril/2010 estavam desempregados, segundo dados divulgados pelo IBGE. Esses dados apenas reforçam a necessidade de reinterpretarmos a noção do que é dignidade do trabalhador. É necessário o reconhecimento da própria dignidade humana em todas as esferas e, nesse sentido, a educação tem um papel essencial. Não é ela a ‘salvadora’ ou ‘última solução’, mas é mediado pela educação, que conseguimos entender os processos a nossa volta e as mudanças fundamentais que ainda temos de desencadear para a transformação social.

Parece-me inconcebível negar trabalho a alguém, já que o emprego, estatisticamente referenciado, o é de fato negado. Lembrando de Engels, é “o trabalho [que] criou o próprio homem”. Não podemos negar ao ser humano a dignidade de produzir e se humanizar, ao mesmo tempo em que se constitui nessa relação. Esse parece ser um ponto amplamente aceito pela maioria das esferas produtivas e pelas camadas sociais.

Porém, esse assunto parece não ser tão aceito assim, quando falamos de trabalho e educação para os privados de liberdade. A própria temática parece gerar ojeriza, frustação e incômodo, quando é defendida por alguém em espaços públicos. O crime perpetrado alcança maior impacto e, esquecemos que, por detrás dele, existe uma pessoa, um ser humano, normalmenete oriundos das camadas mais baixas da sociedade e excluídos dos direitos sociais fundamentais de cidadania.

O indivíduo, seja livre ou privado de liberdade, possui direito ao trabalho e a educação. Tanto a Constituição Federal (art. 6º), quanto a Lei de Execução Penal (art. 41, inciso II; art. 17) preconizam esses direitos. É preciso quebrar o ciclo vicioso de que, uma “vez preso, preso para sempre” ou “bandido não se recupera”. De fato, criminosos profissionais tem tido baixa incidência de recuperação, mas os milhares de excluídos sociais ou “homo saucer”, para lembrar Zygmunt Bauman, que sempre foram tratados socialmente como “lixos humanos”, podem sê-lo. Essas vidas não precisam ser desperdiçadas.

Dois avanços promissores, no sentido de garantir a possibilidade de mudança no espaço das prisões, ocorreram no mês de maio último. O primeiro foi o passo dado pelo MEC, que homologou o Parecer CNE/CEB nº 4/2010, do Conselho Nacional de Educação, que estabelece Diretrizes Nacionais para a oferta de educação para jovens e adultos em situação de privação de liberdade, visando ampliar o atendimento hoje praticado que atinge pouco mais de 10% da população carcerária. O segundo foi a Lei nº 12.245/10 que altera o art. 83 da Lei de Execução Penal, para autorizar a instalação de salas de aulas destinadas a cursos do ensino básico e profissionalizante nos presídios.

Esses avanços, atendendo a direitos fundamentais do indivíduo, apontam para o reconhecimento da dignidade do homem. Ainda é pouco, já que temos abismais diferenças sociais, que cada dia mais, leva milhares de jovens e adultos para a criminalidade.


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